Chamou-me Pedro, tenho 19 anos (já quase nos 20), estou a estudar Teologia na Universidade Católica do Porto (primeiro ano) e sou estudante ? a Carmelita Descalço (postulante, para ser mais preciso). Uma pergunta muito comum que me fazem é “descalço? Mas estás calçado!”. A segunda pergunta mais comum que me fazem é “porquê? Como é que sabes que a tua vocação é ser frade?”. Escusado será dizer que mais fácil é responder à primeira: um riso amigável. À segunda pergunta, a coisa complica-se porque já se está a falar de algo muito íntimo: a minha relação com Deus. Antes de começar a entrar por aí, queria só deixar-te claro que embora se possa dizer que este é o meu testemunho vocacional, e não estaria errado, mais correto é dizer que este é o testemunho de Deus na minha vida…

Agora que já comecei, o difícil é parar. Quando foi que Jesus me chamou? Já contei a história algumas vezes, sendo que nessas vezes começava por março de 2019. Desta vez, porém, começarei um pouco antes…

A juventude é mesmo como dizem: um período de descoberta. Os meus 15 anos foram marcados por uma fase muito difícil que ia culminar no já mencionado acontecimento Março_2019. Entre diferentes fatores estava a minha insatisfação com o estado da minha vida social e espiritual (mas não tinha consciência da segunda). Os ‘amigos’ que eu tinha, pessoas de quem ainda hoje me lembro com simpatia, não eram os ‘amigos’ que eu sentia, dentro de mim, que queria ter. Havia algo que faltava, algo que não estava a encaixar e eu não percebia o que era (sabe Deus a agonia!). Comecei, então, à procura… À procura, sim, mas de quê? Não sabia. Sentia em mim uma inquietação e uma saudade que se intensificavam e não eram mais do que  o crescente vazio no meu interior que eu ansiava preencher.

Março_2019 chegou e eu fui um mês para a Austrália (na Gold Coast)! Quando penso neste mês, tão marcante na minha vida, só me consigo lembrar do que Deus diz, por intermédio do profeta Isaías: «Não temas, porque Eu te resgatei, chamei-te pelo teu nome, tu és meu.» (Is 43, 1). As conversões não se reduzem a um momento singular, elas são contínuas, parte integrante de uma história que, por sua vez, tem momentos que se destacam. Na minha, este é um desses momentos. Sabe Deus, e agora também tu, o que sofri nesse mês. Chega um momento que “ou vai ou racha”, e eu rachei. Aquele grupo não era o meu, não era o grupo para o qual Deus me fez, não era o grupo onde eu ia encontrar a felicidade que Deus desejava (e deseja) dar-me. A meio do mês, a minha mãe, que, entretanto, procurava um grupo para mim, deu-me uma notícia que me ia levar por um caminho um pouco inesperado: o “Rumos”. Lembro-me da minha resposta como se tivesse sido anteontem: se a mãe acha que eu deva ir, eu vou. Começou a ver-se mais um pouco de luz na minha vida…

Acabou o mês e eu regressei a Portugal. O encontro “Rumos” foi no mês de Abril (Abril_2019). Para mim, foi uma verdadeira experiência de Deus, uma autêntica explosão de alegria, de serenidade, de fé, esperança e amor! A comunhão vivida entre os três ramos do Carmelo – irmãs, frades e seculares – tocou-me na minha mais íntima interioridade. Diria, até, que este dom acordou-me para o desejo de Deus, isto é, apercebi-me da minha insaciável sede de Deus, e de como Ele me procura… Foi neste primeiro Rumos que pedi para fazer uma experiência vocacional numa comunidade de frades. Talvez tenha sido um pedido ingénuo ou inocente, mas agora vejo a sua verdadeira natureza: foi um pedido guiado pelo Espírito Santo. O meu entendimento sobre estes assuntos (vocacionais) era muito reduzido, mas a graça de Deus não se deixou limitar pelas minhas limitações. Seguiram-se os seguintes encontros do Rumos, ao longo dos quais fui sendo acompanhado e fazendo diferentes experiências vocacionais, que guardo com grande alegria na minha memória. Ao longo do meu caminho no Rumos e a nível pessoal, fui contruindo amizade com o Carmelo e com Deus. A partir dessa amizade, fui-me apaixonando por ambos.

Continuei o meu caminho. No dia 19 de março de 2021 (Março_2021) enviei o meu pedido de entrada na Ordem dos Carmelitas Descalços e a 2 de setembro de 2021 comecei o meu aspirantado na nossa comunidade de Fátima. Que ano esse! Cresci muito com essa experiência. Diria que o que mais me marcou foi a vivência da profunda comunhão entre Irmãs, Frades e Seculares. As relações desenvolvidas ao longo desse ano abriram-me a uma diferente e mais profunda visão sobre o ‘concreto e real’ do nosso dia-a-dia e da minha relação com Deus…. Terminado o ano, segui para o Porto, onde me encontro agora, de modo a começar os estudos de teologia, que bem precisava!

Antes de concluir, queria falar um pouco mais sobre uma pessoa que me tem sustentado em todo o meu caminho: a Virgem Maria. A nossa história vem desde que sou pequeno. Nas alturas mais difíceis da minha vida foi ela que me resgatou, para que Jesus me salvasse. Nas melhores alturas da minha vida, também lá estava Maria, a rir-se comigo. A minha experiência vale o que vale, garanto-te, mas “ponho a mão no fogo” em defesa de que Maria é o caminho mais seguro, mais fácil e alegre para a Felicidade, que é Jesus. Maria sorri connosco, sofre connosco e ama connosco.

Realmente, ainda não respondi à pergunta «porque é que queres ser frade?». Em verdade, não posso dizer que saiba, em termos absolutos, que a minha vocação seja a de ser frade, embora às vezes gostasse que assim fosse. No discernimento vocacional, faz-se um caminho em que vão surgindo desafios. Nós somos confirmados na vocação na medida em que observamos, em nós mesmos, a ‘estrutura interna’ que nos capacita para conviver positivamente com esses desafios. Uma vez que estou em discernimento vocacional, ainda estou em processo de confirmação.

“Rezemos um pelo outro, um com o outro,”

Pedro

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